"
V E L H I C E "
(
Crônica )
Maria de Fátima Queiroz Pinho Matvichuc
(Fátima Queiroz)
Vivi parte de minha vida recomeçando a vida e me amargurando com a vida que fugia..
Pouco a pouco envelhecendo, me dei conta do quanto vivi e
experimentei este mundo, o qual
hoje me é totalmente desconhecido. Envelheci...mas continuo vivendo. Vivendo de
recordações e pensamentos. É
necessário pensar. O homem é obrigado a pensar. Mas...em que pensar, se no
pensamento encontro um grande e imenso vazio ?
Envelheci ! Envelhecemos ! - Dizem
ser uma lei natural, concebida pelo Criador. Ficamos fragilizados fisicamente,
mentalmente e emocionalmente. É justo isso ?
Com o passar dos anos, nossa imagem vai se transformando, se distorcendo
e chega um ponto, que ao olhar no espelho vemos refletida uma outra pessoa, uma
estranha, que nos revela uma realidade contundente. Isso me faz lembrar um episódio
cômico com uma velha tia minha ( já falecida), que ao mudar para nova residência,
entrando em um quarto começou a
gritar furiosamente em sua senilidade. Correndo para acudi-la constatamos o óbvio:
ela gritava apontando para um
grande espelho, fixado atrás de uma porta, dizendo que uma velha horrorosa
queria agarrá-la. A velha era sua própria imagem envelhecida, que via
refletida no espelho e a aterrorizava. Neste universal e colossal teatro de Deus
a velhice é uma tragi-comédia na
qual os atores se esforçam para levar com êxito o espetáculo ao final.
A sociedade nos segrega, pois para ela não temos mais nenhuma utilidade.
E na sua hipocrisia, sorri e nos fala em solidariedade, fraternidade,
filantropia, honestidade e justiça. Que ridículo ! - Nos ditam conceitos e
regras, que nos obrigam a obedecer passivamente calados e esperando... sempre
esperando. Mas...esperando o que ? O séquito do Senhor, que nos acompanhará na
última viagem ? Ou na longa
espera, fechar os olhos e dormir...dormir...dormir, pois o sono é tão bom, é
mergulhar no esquecimento...e isso nos faz bem, muito bem. Infelizmente é uma
doce ilusão passageira, pois ao acordar, nos defrontamos com esse inexorável e
cruel sistema contra o qual veementemente protestamos. Essa é a dura realidade
de milhões e milhões de velhos espalhados por este mundo, principalmente os de
classes menos privilegiadas, abandonados e vivendo na solidão dos asilos públicos.
É penoso e deprimente.
Resta-nos efetivamente irmanarmos em nossa revolta e lutar. Lutar muitas vezes contra o desrespeito e ingratidão da própria família, lutar contra essa sociedade que nos marginaliza, lutar contra esse estúpido preconceito de que a velhice é a estagnação do homem. Enfim, lutar sempre, não desistir, mesmo sucumbindo à guerra. Cair, mas cair com bravura e dignidade, pois na vida o importante não é vencer a batalha, mas lutar com coragem e denodo até o final, pois a vitória pertence a DEUS.
(Conto publicado na Antologia 2003 - “Talentos da Maior Idade” da Litteris Editora – Rio de Janeiro, páginas 80 e 81).
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